Homenagem a meu avô Ditimar

Ditimar Vasconcelos, crônica de Melissa para a revista da Academia Ubajarense de Letras e Artes

Por Melissa Vasconcelos

Para a maioria das pessoas, este nobre cidadão era alcunhado de Seu Ditimar, conhecido também como “Bonequinho”, em virtude de sua beleza – como meu pai, seu genro, costuma muito me dizer, rindo.

Ditimar de Oliveira Vasconcelos nasceu em 29 de outubro de 1932. Filho de Raimundo de Oliveira Vasconcelos e Augusta Lima Vasconcelos, estudou no Seminário, em Tianguá; trabalhou como soldado na Base Aérea de Fortaleza, e durante muitos anos, foi caminhoneiro, além de ter sido maçom na Maçonaria de Ubajara.

Porém, para mim – e para os meus inúmeros primos – ele era o vovô Ditimar. Todos os dias, acordava cedo, sempre o primeiro da casa a se levantar, para depois caminhar até o bondinho. Saía, simpático, pelas ruas. E eu, que tive uma convivência muito estreita com os meus avós, desde pequena, ia junto com o meu avô, de mãos dadas, fazer a feira na barraca da Dona Diva, ao mercado de carne do Seu Lista, comprar castanhas-do-pará nas barracas do antigo mercado de Ubajara, que hoje, converte-se em um calçadão de eventos.

Até os meus dez anos, foi assim: a minha vida repleta da vida do meu avô. Nos meus cinco anos de idade, tempo em que fui aluna do infantil 5 do Instituto Nossa Senhora de Fátima, guardo uma memória cravada em meu peito – meu avô foi me buscar na escola, no final do dia, às 17h. Usava uma boina, sapatilhas, uma bermuda e uma blusa social clara; como de costume, usava óculos, e mostrava seus bons e autênticos cabelos brancos.

Ele se pôs no centro da porta de entrada da minha sala, baixando a cabeça por baixo da boina, quando minha professora interrompeu a aula e disse: “Melissa, quem é aquele ali que veio te buscar?” Eu, criança, vendo aquele senhor abaixando a cabeça para não ser visto, demorei a reconhecer, e tanto meu avô quanto a professora riram.

Foi ali, ao ouvir o som da risada do meu avô, e já tendo o reconhecido ao observar suas pernas, que eu o percebi, com muita alegria e a pureza de amor que somente uma criança é capaz de sentir: “É o vovô!”. E corri para abraçá-lo. Aquele tinha sido um dos finais de tarde e dia de aula mais especiais, se não o mais especial, para mim, pela simples presença do meu avô, que me buscava em sua F-1000 amarela.

E como eu poderia esquecer da F-1000 amarela? Quase todos os dias – senão, todos os dias – meu avô, quando eu não estava em sua casa visitando ou passando o final de semana, ia nos visitar na casa dos meus pais, e o barulho do motor do seu carro era inconfundível, assim como o som da buzina. Eu reconhecia de longe, mesmo antes do carro estacionar na frente da casa.

Ali, aprendi a distinguir os sons, os motores e reconhecer o carro de cada pessoa, o que me faz, até hoje, saber sobre cada visita que chega, antes que toquem a campainha. Sempre quem ajeitava minha bicicleta era meu avô: comprou uma bomba para encher, semanalmente, os pneus de minha bicicleta.

Comprou, também, uma capinha acolchoada para que a cela não me deixasse assada. Por fim, para que a homenagem não se converta em um livro de romance, meus avós – em cada episódio que estava presente meu avô, também estava junto minha avó – me levavam à missa todos os domingos, às 7h, e ainda que não fossem à Igreja todos os dias, em todos os dias, assistiam ao terço e à missa, aos finais das tardes, às 18h.

Nessas tardes, eu deitava entre os meus avós: meu avô sempre do lado esquerdo da cama, minha avó, do direito, e eu, no meio, entre os dois, que faziam, cada um, carinho ora em minhas pernas, ora em minha cabeça, enquanto nós três estávamos em reza.

Nunca houve uma vez que eu não andasse na rua com meu avô que não fosse de mãos dadas, e com ele falavam, e a ele perguntavam – “é sua netinha, Ditimar?” “Sim, é minha netinha, a Melissa.” Cresci conhecida, entre a maioria, como a neta do Seu Ditimar e da Dona Fransquinha, desde criança, com muito amor, carinho e orgulho.

Grande cidadão Ubajarense, faleceu em 08 de dezembro de 2018, na Santa Casa de Sobral, mas jamais será esquecido no coração de seus parentes e amigos. Antes que meu avô entrasse na UTI, tive a oportunidade de ser abençoada por ele, pela última vez – “Deus te abençoe” foram suas últimas palavras que ouvi em vida.

Meu amor e respeito por meu avô são o resultado do amor que recebi do famoso Seu Ditimar durante todo o meu crescimento, e em mim, sempre haverá, não só fisicamente, mas internamente, a tatuagem do seu legado.

Como forma de eternizar a memória de meu avô, intitulou-se, em 2019, a Rua Ditimar de Oliveira Vasconcelos, em Ubajara, que, conhecido pela sua generosidade, bom humor e enorme coração, deixou uma marca indubitável como cidadão Ubajarense.

Tive a honra de crescer e passar minha infância com ele, ouvindo os sermões: “quem fica de ‘coca’, papoca!” ou “eu só vou sair dessa mesa quando tu raspar esse prato, eu duvido que tu coma tudo”. Gostaria muito de que ele ainda estivesse vivo e lúcido, que tivesse participado e visto o lançamento do meu primeiro livro na Câmara Municipal.

Que visse minha transição de crescimento completa, que tivesse me acompanhado nos meus primeiros amores e experiências, o que eu tenho certeza que ele seria vigilante e protetivo, que me orientaria – eu, provavelmente, seria chata como uma adolescente, mas sua orientação para me proteger pesaria mais que minha chatice.

Porém, agradeço pelo tempo em que consegui conviver com ele, e espero que ele esteja observando o que acontece, de onde quer que esteja. O legado que escolho carregar do meu avô é este: o amor, a honestidade, o coração grandemente generoso e a bondade.

Sinto-me feliz e orgulhosa de carregar, comigo, pelo menos 1% de quem foi Ditimar de Oliveira Vasconcelos, o DOV, o meu avô, um dos corações mais bonitos que tive a chance de conhecer. Que consigamos sempre honrá-lo e lembrá-lo com amor. Estas são as palavras, as lembranças e os desejos de sua neta que o amou e sempre irá amá-lo. Termino este texto com os olhos marejados, e o coração cheio de saudades.

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